terça-feira, 12 de maio de 2015
Espero sentado em um banco, cabisbaixo com uma mão na outra também cabisbaixas. Ouço as botas pesadas contra o chão. Eles chegaram. Levanto do banco. Seis soldados com coletes e máscaras. Colocam um grande saco preto no chão. O comandante mostra seu rosto nipônico e diz que o pedido está pronto. Dois enfermeiros se aproximam para verificar o conteúdo. Olho ao redor, o hospital era o único prédio iluminado na madrugada. Suspiro. Acenam pra mim afirmativamente, o corpo está correto e os órgãos internos também. Eu só precisava de um osso grande qualquer que não sei, mas eles só produziam completos. Você podia basicamente pegar qualquer parte pra si; exceto o cérebro, que eles vinham sem. Falência cerebral era a única maneira de morrer. Isso ou ser pobre. O governo dizia que tal coisa não existia mas todos sabiam que se precisava de sua permissão ou de dinheiro para poder se reproduzir - bem, o fato era que quem tinha filhos não regulamentados sumia alguns dias depois. Algo que realmente me incomodava era o rosto do meu recipiente que parecia genérico e inexpressivo, como se todos os recipientes tivessem esse rosto - mas eu não tinha como saber disso porque era o primeiro que eu via. Eu tinha um osso quebrado internamente que acabaria perfurando um órgão vital, algo assim. Convenceram-me que eu precisava daquela cirurgia.
segunda-feira, 11 de maio de 2015
Ouro Preto perdeu seu encanto quando eu me encantei por minha menina. Além do sujo das pessoas, essas festas não combinam com aqui; meu conhaque combina, minha sinuca combina, meu cigarro combina, solidão combina.
Que outra cidade tem o frio do sul e o calor do nordeste num cenário tão próprio? Mas nada igual, são só sabores abrandados pela distância. Foi o vento quem trouxe. O vento que por vezes uiva; sem notícias, sem objetivos. A cidade que geme ou os moradores que suspiram? Há um manto triste sobre a cidade e todos ignoram. Amar a lua é fácil mas não sei se te gosto, cidade. Não sei se te desejo fim ou salvação, cidade. Há uma dualidade trazida, não nascida. Nativos ariscos e estrangeiros aproveitadores. Há ressalvas de ambos os lados; onde não há? Mas bosta ou meia bosta não me apetece por igual. Eu queria a cidade só pra mim. Ou me enganei de te pensar mágica? Ou me iludi com toda essa beleza viva?
Era eu inocente demais? Era eu virgem demais?
Ah, Ouro Preto, quem é o escravo agora? Diz-me se essas ruas asfaltadas não são cicatrizes cinzas em teu corpo. Diz-me se esses prédios feios não são queloides que jamais sumirão. Diz-me se sofres ou se sofro sozinho por ti. Dize-me aqui baixinho só pra mim se essa chuva lava teu sangue e choro. Mente nossa semelhança. Explana minha loucura. Acalente-me com tua nudez e uma canção de ninar dos mortos.
Que outra cidade tem o frio do sul e o calor do nordeste num cenário tão próprio? Mas nada igual, são só sabores abrandados pela distância. Foi o vento quem trouxe. O vento que por vezes uiva; sem notícias, sem objetivos. A cidade que geme ou os moradores que suspiram? Há um manto triste sobre a cidade e todos ignoram. Amar a lua é fácil mas não sei se te gosto, cidade. Não sei se te desejo fim ou salvação, cidade. Há uma dualidade trazida, não nascida. Nativos ariscos e estrangeiros aproveitadores. Há ressalvas de ambos os lados; onde não há? Mas bosta ou meia bosta não me apetece por igual. Eu queria a cidade só pra mim. Ou me enganei de te pensar mágica? Ou me iludi com toda essa beleza viva?
Era eu inocente demais? Era eu virgem demais?
Ah, Ouro Preto, quem é o escravo agora? Diz-me se essas ruas asfaltadas não são cicatrizes cinzas em teu corpo. Diz-me se esses prédios feios não são queloides que jamais sumirão. Diz-me se sofres ou se sofro sozinho por ti. Dize-me aqui baixinho só pra mim se essa chuva lava teu sangue e choro. Mente nossa semelhança. Explana minha loucura. Acalente-me com tua nudez e uma canção de ninar dos mortos.
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