São duas horas da tarde. Do quarto fechado, da cortina improvisada, do suspiro apertado, pouca diferença faz. Do desespero velado, do monótono feriado, nada importa. Não importa a gaiola de meu corpo se estou preso nele. Se não saio de mim, se tenho toda essa pele, toda essa pretensão de ser outra coisa. Não me cobro voos loucos, noites de embriaguez ou o calor de uma cama. Quero ser minha loucura, quero licenciar-me do mundo por dias ou semanas. Tem muita coisa viva em minha mente esperando ser digerida ou apodrecer. O tempo é mais louco do que jamais serei. Não sentes na pele toda a pressão do mundo? Não te aferra a carne o desespero das horas? De ser qualquer coisa. De estar noutro lugar. De mover-se, correr, talvez de si, sempre de si. Não estremece teu corpo com o peso de tudo? Manter a sanidade se torna secundário. Como sobreviver até amanhã? Tua mente se rasga entre lembranças e possibilidades, as bordas inexistentes de teu ser fazem forte sua ausência. Expande-se em tudo que pode tocar, efêmeras, as coisas, o pensamento, o tato... O paladar permanece, a fome reina. Já passei uma semana sem minha consciência, nunca passei mais que um dia sem minha fome. O prazer inexistente de cravar os dentes, o sabor percorrer tua boca até tua garganta. Salivar na ideia de ter.
Se te perguntarem hoje, mente que entende.