domingo, 11 de novembro de 2018

Estou febril, talvez delirando. Diria de novo mas já perdi as contas, pode ser a primeira vez. O quarto gira no sentido contrário da minha cabeça. É uma rejeição natural do meu corpo à realidade. Quando virá as convulsões ou o desespero? Virão? O vento espalha meus pedaços, não me lembro de ter um ventilador ou de ter aberto as janelas. O sopro uiva em seu caminho por meu labirinto desfigurando tudo que toca.

Não sei se minha doença reside no corpo ou na alma. Nos meus olhos ou na minha mente. Se o mundo se dissolve frente a meus olhos de ampulheta, tudo são ponteiros que circulam numa velocidade excruciantemente lenta, inexoráveis em seu compassar.

A cadência de minha respiração é a cadência dos raios solares desvanecendo, é a cadência dos corpos indo ao chão, é a cadência do meu desespero. O ritmo do escorrer da chuva harmoniza com meu caos.

Não há decadência no fundo do poço. Na superfície o chão é o limite.

As emoções se diluíram e escorreram pelas rachaduras na minha alma agora rochosa. Correr não faz mais do coração o tambor insano e delicioso. A cadeia é a liberdade dessa estrada sob meus pés. Cheio de força e vazio de vontade, o que fiz comigo?

Não sei em mais quantas linhas descrever desespero, foge de minha compreensão essa sensação absoluta quando já encarei, bati de frente, corri, aceitei. desespero-me de desesperar

Dormir. Antes um portal de medo nascido de não saber quem acordaria, tornou-se a esperança de acordar e de fato não reconhecer o rosto no espelho.
Nada irá se enterrar por si só. Enterrei todos os outros, quem me enterrará? Não pertenço ao mar, meus mares são de morro, serão onde morro. O mundo que me sepulte em sua cruel naturalidade.

Minhas mãos não tremem, minha mente que anda trêmula e cambaleante. Não me conecto a mais nada, nem as frases consigo mais conectar; como conectaria essa cabeça quebrada? Vacilante, meu pensamento apoiado em seus joelhos se levanta cego para não ficar no chão, que morra de pé, que morra em vão.

As lágrimas não vão cavar seu leito em meu rosto, não há tempo.
Perdi-me nos caminhos circulares que percorri disposto.
minha loucura e minha lucidez deram espaço a uma coisa que me mata,
uma coisa que não posso chamar de loucura perdida a leveza, a fluidez que equilibra e dança em caos
vendida a lucidez em madrugadas que se recusam a fenecer sob o sol, que se arrastam pelo dia, que se cravam em meu peito, costas e braços, num aperto frio que o calor queimando a pele não faz mais que ressaltar
combinadas nesse desespero torpe, o pior de dois mundos, o otimismo que se finda cândido
beira o cômico cometer todos esses erros, não sei o que é mais absurdo.

Este corpo retalhado é um pequeno reflexo desta mente remendada.
Absorvi tudo que alimentei de mim. Devoro meus defeitos para crescê-los sórdidos e retorcidos.
Sou um castelo vazio ruindo por dentro.

Minha falta de ar não é medo, é fúria contida, desmedida em sua natureza

Como loucura e espiral não são escritas com as mesmas letras?, se me sinto rodar a cada segundo que passa

Olha o tamanho de minhas mãos e de minha boca. Veja o tamanho do mundo. Mãos pequenas para uma ambição tão grande. Uma boca pequena para a fome imensurável.

me refugio, se há algum refúgio, nas águas
escorrendo em meu corpo levam muito mais que a sujeira cotidiana
em minutos erodem todas minhas crostas
expõem e conturbam o meu cerne

Como me pedir para dormir se há algo me consumindo vivo?
Corpo egoísta de uma mente tola.
Carne sensata de uma alma desmedida.
Ver-se no ponto de lutar contra si para perder de qualquer jeito.

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Não finda agora o ano, tampouco termina a vida. Mas já sei que a palavra por mim mais dita neste ano foi socorro. E sempre a ninguém. Um socorro gritado no carro fechado. Pensado ao banho. Sussurrado ao deitar. Nunca antes acordei chorando. Que horror. É ter os temores tão vivos que as portas do sono nada seguram. Se mais desespero, se mais agonia, como mensurar quão ruim? Em que se contam as batidas que o coração perde ou se mede o peso dos suspiros?
Ah... Endurecer, endurecer, endurecer, travar a mandíbula fechando o coração, essa é a forma de sobreviver. O corpo teso, a alma dura. Os dentes que me abocanhavam nem babam mais, perdido meu gosto nesse temor. Minhas mãos não tremem. O batimento silencioso. Quando este teto cairá sobre minha cabeça? O silêncio não me mata. O suave escorrer da areia na ampulheta rasga meu peito mais que todas essas facas. Cada segundo parado minha mente é dilacerada. Pra quê, ou melhor, como se preocupar com a morte se a loucura é um perigo tão maior? Tão mais próximo, tão íntimo...
Nas chamas da loucura insanidade fúria me perco. Todas essas voltas num círculo que vai se fechando. A violência do tempo me espanca.

sábado, 12 de maio de 2018

Escreveria um texto em tua homenagem
mesmo que não tivesse nada de ti
mesmo que já não me lembre nada além do rosto
mesmo que eu minta gritando nas entrelinhas
mesmo que eu não grite
mesmo que eu me perca em memórias que queimei
mesmo que nada mais seja o mesmo
mesmo que seja servido sem música
mesmo que eu use palavras repetidas
mesmo que eu perdesse a data por estar trabalhando ou no bar
mesmo que tenhamos na distância nosso tempo
mesmo que de tua boca escorra veneno e da minha só tenha silêncio
mesmo que disso se distorça tudo
mesmo que nos matemos lentamente no que julgávamos mútuo
mesmo que de tua boca materialize-se meu fim
e de tuas mãos verta o leito de ti
e de meus dedos sangre o texto de tua morte

insanidade agora nos combina
quebrar o mundo em todas as partes, nos quebrar até o irreconhecível
o corpo contra a parede e quem somos senão a nossa mera percepção de nós mesmos
torpes palavras sem conteúdo, ditas ao mundo por qualquer, repetidas pelo mundo em quaisquer
perdida no tempo, entremeada de subjetividade, totalmente aquém do que realmente deveria nos definir
não nos envergonhamos da indecência de nossa representação
quem somos senão perdidos de nós mesmos
quem buscamos senão a si e o corpo do outro, o que vier acompanhado é brinde ou punição

não me fale de sagrado em coisas assim.
não faz sentido derramar emoções no teclado se nos manteremos nessa distância que não se machuca e não se sente.
o risco de queimar é menor que o prazer do calor, não fujas de tudo que anseias

corra, corra como todas minhas mentes
corra como tudo corre de mim
serei a destruição, a mão pesada que desce sobre ti
serei o medo e a indecisão de todos vocês, e de ti o furacão de lágrimas e fúria apaixonada de teus pesadelos

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Os olhos de peixe morto, dirias. Não estou aqui, nem interessado. Sabes muito bem do fogo de meus olhos. E se não os vê agora... Bem, se perdes o olhar de tua perdição, te bendigo em lábios macios com palavras doces com o adeus que não quis dizer. Talvez fosse mais estético se mais dramático o fosse. Talvez saibas mais que eu que fico tudo que posso e, se vou, não volto. Talvez tenha sido apenas um dia ruim para nos encontrarmos. Hoje eu trocaria tudo pela força em palavras de fazer chorar a todos. E trocaria todas as lágrimas vertidas e todas as respirações suspensas e toda minha escrita pela chance de atear fogo ao mundo. E trocaria o mundo em chamas por um pouco de paz. Talvez não.

A gaita me chama para o mundo no blues do ambiente. Estou perdido em pensamentos novamente. Não me recordo de ter entrado nesse bar, pedido essa cerveja e, confesso, não reconheço quem está na minha frente. Pedir licença e pagar uma parte da conta deve ser o suficiente. Outro dia parei numa livraria, ninguém me parou para ser solícito. Penso se estou emanando antipatia ou caos. Existem lugares na mente que, como nas cidades, uma vez lá não há retorno.

Por que não jogo essa garrafa contra a parede e me conforto no barulho do estilhaçar? Por que insisto em me arremessar em grades que crio? Minha cabeça treme com olhos vacilantes esmagada em paredes arenosas. Preso numa sala que se fecha, as palavras sufocam me afogando, arranhar o caixão depois de enterrado, minha mente está ilhada em partes irracionais, perco as noções do pensar, só há dor.

Tudo se mistura. Como um quadro derretendo depois de anos feito. Como tudo que observo, perdendo suas bordas e definições, se entrelaçando em coisas sem sentido. Não vejo porta nesse quarto só de paredes. Não há sentido em portas se tudo é uma gaiola. Não vejo saída, nem como expressar completamente essa sensação.

me perdi numa dessas de pensar no tempo
Estou preso. Esse é meu presente, maldito e único. O passado escorre por minhas mãos como areia, consigo segurar algo mas tudo mais me foge, se apaga de minha mente sem piedade. O futuro foi estilhaçado, e um futuro não se faz do nada. Cravo unhas e dentes na sanidade de minha carne.
coisas antigas tão enterradas que não consigo entender como as estou pensando, ou vendo, ou sentindo. coincidências demais, meu cérebro liga coisas demais que não deveriam nem ser pensadas
de que vale o passar dos anos se vem tudo assim? de que vale o passar do tempo se a ferrugem, o estrago, fazem acalentar o natimorto de teus sonhos?
O tempo embalsama o passado corroendo o presente.

me jogo contra teu corpo em desejo
me entrelaço com a parede em desespero
colapsando em si, minhas mãos que não tremem de medo, estremecem de antecipação, estou fazendo algo errado, vivendo coisas ao reverso, aproveitando coisas que perdi e saboreando a loucura, tudo que foi breve por não ser leve e tudo que se reduziu a pó por não ser
como questionar o que não existe? como arguir assim a si sobre sanidade?
como escrever o desespero?
a conexão das palavras é vã - a pontuação, fútil
o caminho para a inexistência é estranho, ser mortal é estranho, correr não faz sentido, pedir socorro não faz sentido, não há aurora de algo novo não há crepúsculo em nosso tempo se tudo já decaiu um corpo podre já está podre, um esqueleto já acabou o fim não tem introdução e se chegou agora, sinto muito. Também me dói.

estou preocupado,não tenho mais a sensação de entrar e sair de um estado de loucura

Não me permito o arrependimento, esqueço de me desculpar, foi mal estrada percorrida, um agradecimento oco para as pessoas-combustível.
no mais, se é uma viagem só de ida, que seja uma viagem bonita

domingo, 15 de abril de 2018

O que vê no espelho? Vejo a mortalidade acima de tudo. A idade ainda não me pesa no rosto mas meus olhos não mentem. Sou meu próprio memento, meu próprio tormento. Não há fuga.

Essa luz amarela não é nada. Essa luz amarela nessa árvore cansada não é nada. Essa luz amarela nessa árvore cansada nessa rua de pedra não é nada. Tudo isso está depois dos meus olhos. As coisas me doem. A loja que se fechou. A obra da rua que acabará. As placas de trânsito empoeiradas. O balcão do bar. A mesa de madeira da padaria. Tudo é dor e não entendo. Essa casa velha que esfarela, esse prédio novo que quase brilha. A sombra das folhas nas grades de aço. Todos esses lugares que passei e as memórias que tenho. Todos esses lugares que nunca passei e as memórias que não tenho. Estou preso em tudo e desperdiçado em mim.

Esse azul que corre anoitecendo na cidade de ouro escuro.
Os raios que rasgam os céus são os que costuram meu peito...
Rasgam de azul e cinza a escuridão da noite. Não consigo conter o sorriso, o texto escrevo de tato para não tirar os olhos dos céus.
Mais fugaz que chama, mais pesado que terra. Se fossem me nomear, trovão antes de fogo. Por favor. Mais feroz que a vida. Mais furioso que eu. Ando no ritmo de minhas pernas, queria muito parar e contemplar mas hoje não há tempo. Não aperto o passo, só um tolo o faz. Disciplina ganha de fúria em qualquer dia mas perde a cada respiração em qualquer segundo.
Um lampejo de paixão, ilusões de vida.
Não sei o que em mim anseia a tempestade. Apenas caminho ao seu encontro. Tudo isso é bonito em palavras e desesperador de viver.

Mas isso foi outro dia. Um dia belo e passado de loucura. Estou sem nome e não sou chamado. Apenas vou e faço, sem vontade, sem estímulo, sem paixão, apenas fúria. Não há cama que estanque meu cansaço. Estou confuso e sem acordo, perdedor em meus próprios termos. Sumirei no meu abismo.

O tempo escoa em tons escarlates de meu braço como areia que escorre de uma ampulheta quebrada. Como lágrimas por um homem quebrado.

terça-feira, 10 de abril de 2018

Não te esmaga o peito esse céu azul? O vento fresco como tapa no rosto. O sol como um soco bem quentinho. Esse cheiro maravilhoso corroendo tuas entranhas.
Acariciaria teu rosto todas as manhãs, tardes e noites fôssemos somente desejo.
Somos todo o resto e isso também.
Ah, se te digo flor, te digo tão bem, em segredo, nas entrelinhas de uma única palavra, toda minha admiração e carinho.
Na natureza dual das coisas belas, tudo é mundano frente ao celestial.
E toda essa beleza causa paz ou mal estar. O ruim deriva da efemeridade, o bom advém do esplendor.
Poderia escrever mil linhas de dor que transcrevessem minha angústia, e apenas um suspiro resumiria em ar o vazio que se faz...

domingo, 1 de abril de 2018

Tudo o que me assusta ou amedronta tem relação com o Tempo. Desespero-me em minha mortalidade. Meu coração pulsa em pressa, minha mente respira devagar; meus olhos frânticos procuram repouso que não existe enquanto estão abertos. Não cabe frenesi aqui. O que me mataria é a repetição. O que me mata é a repetição.
Quero gritar socorro. Quero resolver tudo. Resolver a vida me parece ruim.
Tento não desesperar mas pareço só correr.

emaranhado no emaranhado de possibilidades, quem fui amanhã, quem serei uma semana atrás? é fácil se perder, acordar sem saber, há noites que me entrego no cansaço, noites que combato para não dormir, noites que não me importo mas em todas elas há um medo em adormecer
insanidade? vivo nela. pesadelos? sempre controlo, exceto hoje que acordei por morrer
o que paralisa meu sono assim?
com certeza o medo de acordar e não encontrar mais em meu peito ou em minha mente o que me compõe hoje

Corro risco de vida, apaixonada a alma que é. Arrisco perder todas essas coisas ruins que carrego com algumas coisas boas que encontro no caminho.

Estou preocupado com essa insatisfação garantida. Que volta e meia assombra. Mas nunca se faz ou desfaz. Os pés em movimento, o pensamento corre à frente. Parar é arriscar não ser mais.
O tempo pressiona e perco a linha, perco os papéis; não ajo nem acho mais.
Alimento minha fome, depois a ansiedade, depois alguma coisa.
Altero minha mente no novo dia, nada mais se aplica. Ando com a firmeza de ter um caminho e sem ter um.
Palavras que não verão a luz, saídas de minha escuridão. Livros embalados. O mover dos ponteiros do relógio na sala. Tudo isso me mata aos poucos.
Reprimir o vômito das palavras se torna fútil. Aprisionei-me em um escritório que gosto. Meu coração é selvagem demais para tanto cimento.
Vou quebrar tudo aqui dentro ou aí fora. Se consegue me imaginar sem algum colapso, não consegue me imaginar. Como não se consumir? Como não enlouquecer? É como pedir a uma árvore que, por favor, não se queime no incêndio.

Como juntar frases soltas em algo conexo? Como se fazer inteiro de tantas partes quebradas? O corpo até aparenta ser o mais forte, os rasgos fecham, as pancadas somem; a alma, a mente e o que mais se tem, estilhaçados. Como se curar de si mesmo?

domingo, 7 de janeiro de 2018

Sempre gostei mais de escrever na máquina, é um movimento, uma dança, um frenesi que entro sem preocupar-me em sair.
Caneta e papel é tão íntimo que repousa solidão, é o que tenho. O trem balança, quase risco a folha por inteiro escrevendo sobre o escrever. Escrevendo sobre o pensar em escrever, a angústia que isso me traz. Minha mente um campo liso coberto por algo que parece neve, local de guerras passadas com explosão de furor e sangue, por vezes literal demais se levando além da literatura. Hoje mal sopra o vento onde houvera furacão. Preocupa-me. É essa a lenta morte? O começo do esperar? Resignar-se? Como em tudo em minha vida, sobrevivo em Fúria. Não tenho calma, furioso comigo me contenho, faço da fúria minha paciência. Não tenho tenacidade, furioso com a mera ideia de desistir, faço dos meus punhos cerrados minha obstinação. Uma imagem borrada e furiosa que substitui e ressalta a falta. Estou cansado além do limite. Já cansado na alma. Em fúria não aceito meu cansaço. Minha vida foi se moldando, da inconsciência para a curiosidade para o puro não entendimento para o desespero para a loucura para a fúria. Estou aqui agora, afastando de minha loucura a quem não sei mais acompanhar, meus pés não são mais leves e saltitantes em brincadeiras mentais. Meus pés são firmes na lama, a todo momento conscientes do peso do meu corpo. E estou pesado. Tudo é uma batalha. Viver é uma guerra. Há sentido nisso? Busco o pão na mercearia em fúria. Viro o leito no copo em fúria. Preparo meu almoço em fúria para devorá-lo em fúria. As bordas das coisas se esvaem. Seus conteúdos se apagam. Minhas cicatrizes de fúria no tempo de loucura perdem o significado.