domingo, 7 de janeiro de 2018

Sempre gostei mais de escrever na máquina, é um movimento, uma dança, um frenesi que entro sem preocupar-me em sair.
Caneta e papel é tão íntimo que repousa solidão, é o que tenho. O trem balança, quase risco a folha por inteiro escrevendo sobre o escrever. Escrevendo sobre o pensar em escrever, a angústia que isso me traz. Minha mente um campo liso coberto por algo que parece neve, local de guerras passadas com explosão de furor e sangue, por vezes literal demais se levando além da literatura. Hoje mal sopra o vento onde houvera furacão. Preocupa-me. É essa a lenta morte? O começo do esperar? Resignar-se? Como em tudo em minha vida, sobrevivo em Fúria. Não tenho calma, furioso comigo me contenho, faço da fúria minha paciência. Não tenho tenacidade, furioso com a mera ideia de desistir, faço dos meus punhos cerrados minha obstinação. Uma imagem borrada e furiosa que substitui e ressalta a falta. Estou cansado além do limite. Já cansado na alma. Em fúria não aceito meu cansaço. Minha vida foi se moldando, da inconsciência para a curiosidade para o puro não entendimento para o desespero para a loucura para a fúria. Estou aqui agora, afastando de minha loucura a quem não sei mais acompanhar, meus pés não são mais leves e saltitantes em brincadeiras mentais. Meus pés são firmes na lama, a todo momento conscientes do peso do meu corpo. E estou pesado. Tudo é uma batalha. Viver é uma guerra. Há sentido nisso? Busco o pão na mercearia em fúria. Viro o leito no copo em fúria. Preparo meu almoço em fúria para devorá-lo em fúria. As bordas das coisas se esvaem. Seus conteúdos se apagam. Minhas cicatrizes de fúria no tempo de loucura perdem o significado.