quarta-feira, 21 de agosto de 2019

O medo do silêncio é simples.
Ele que escorre feito água por meu corpo, repousa em meus pés em uma poça, onde me verei refletido - querendo ou não, de onde meus olhos me fitarão profundos. Talvez me perca nesse mar castanho mas a triste calmaria dá uma certeza de retorno, de sua inevitabilidade. Não posso viver mergulhado em mim, não há fôlego. Que eu retorne por obrigação, como fim de todo ciclo. Que eu retorne por vontade, como início escolhido de caminhada.
Ele que é uma câmara onde se revela a vã tentativa de capturar na mente a luz dos olhares.
Essa coisa densa quase palpável que pesa todo movimento.
As amarras que crescem em minha boca como ervas que trançam uma árvore sem, a princípio, sufocar
a vontade e talvez o instinto me dizem para fechar os olhos
e o silêncio não me deixa
devo ver, devo sentir, devo absorver todo o silêncio que meus olhos tocam
não são de devorar como frutas saborosas
ou algo qualquer que cede sob a mordida da fome
não posso desviar o olhar como em reflexo ou asco
o toque não ocorre porque espera-se que ele quebre o silêncio
e o silêncio que não quebra com as mãos é o maior medo de todos
é o silêncio que não se curva a murros ou gritos, inquebrável
e essa realização é o próprio desespero, é a própria ascendência na loucura
é o que traz a fúria e o sangue e arranca do poço a escuridão
e não mergulha pois a traz pra si e não afoga pois ensandecido nada teme
e não corre. não se corre do silêncio.

respiro o ar silencioso que anda por onde andam os ventos no corpo
hoje não há uivos nos labirintos, que sem o medo são só caminhos
falaria do silêncio das cadeiras, se fosse uma era a solidão, se fossem duas era o abandono, se fossem mais era uma perda, e não quero que interprete tudo errado dessa maneira
percebo as lacunas na mente, das coisas que não quis ou não aguentei
talvez exista um nível além da tolice em que um tolo permanece tolo por escolha
o silêncio existe além da solidão