domingo, 15 de dezembro de 2019

Não sei se me pesa a carga que deveria mas olhar para o ano só me traz que afastei-me. Perdoem-me os pássaros nas árvores, as árvores no chão, as pessoas nas casas e nas ruas. Fechei o coração.

Sinto tudo. O sol refletindo na água, as folhas ao vento, as sombras que dançam, as nuvens que correm, até o que toca meu corpo. Um corpo colado ao meu. Alguém escuta meu peito, espero que diga coisas como a brisa do amanhecer ou o frescor que anoitece. Não sei qual passo ele vai desmarcar e tropeçar. As amarras prendem minha boca por dentro.

Sinto muito. De peito fechado atropelo tudo. Tudo é precioso mas nem os respiro. Ando passo após passo. Sou uma máquina com dor.

Desculpem-me as coisas alegres e - talvez por isso - distantes, falemos as coisas tristes. Dancemos as coisas estáticas. Enganemo-nos ao redor dessa fogueira. Esse brilho fugaz que corre para a escuridão de meus olhos. Nada ilumina. Apenas se esvai.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Morderia minha mão inteira, não me permitiria divertir
O que aconteceu nesse meio do caminho do que chamamos vida?
Era já há muito dominado pela fúria, uma constante em todo meu tempo. Mas não ter nada além disso é algo novo em que me peguei no meio, e me peguei não gostando.
É como queimar o tempo todo.
Qual o valor do fogo quando se está o tempo todo em chamas?
Chegarei onde quero, eu e minhas cinzas, nada valerá a pena assim.

Os cabelos de ilusão, a barba de tristeza.
Por fazer, a fazer, aparada cresce a barba de fúria
deformando meu rosto
Toda essa fúria e a morte interna
A morte que vomito, escarrar é solta-la ao mundo
Oco, a cotovelada no rosto faz um barulho oco quando se arrebenta contra meu nariz

Minha cabeça já não me roda mais
Tenho os pés firmes, as pernas fortes, quase tudo de pedra
quase não mexo, quase me divirto, quase não danço
comovo-me mas quase não aparento,
Em que momento me tornei essa crosta de pedra com fogo dentro?

Apagarei? Romperei? Ou me quebrarei de uma forma estranha e amena?
Cresça a árvore em mim, com raízes em chama e folhas de rocha.
O tronco firme e os galhos flexíveis.
Planta em erupção na erosão do meu ser.
Madeira vermelha petrificada.
Lume em lenha viva.
A necessidade de renascer, torto a qualquer preço.
A dualidade de querer ver tudo florescer e queimar.
Querer se acabar em um instante e perdurar a ver findar lentamente as coisas.
O desespero de nunca parar de andar.

domingo, 1 de dezembro de 2019

Desperdiçados em ti, esses cigarros acumulados em teus lábios, seus restos em teus dentes, nas calçadas e nos pulmões.
Por que distanciamo-nos as bocas e aproximamos de nós os vícios?
Preferia ouvir teus gritos que nunca ouvi a esse silêncio.
Um tapa, uma explosão, a indiferença traz o desespero. É a morte de todas as coisas.
Trouxemos nossos abismos internos para o meio de nós. Nem um metro de distância posto de uma forma intransponível.
Um silêncio transparente como vidro, forte como vidro. Tragar parece mais fácil que falar.
A cerveja, não importa quão amarga, não consegue ocultar o amargor já presente na boca - talvez alivie algo gelada nos breves segundos que desce a garganta - deixado pelas incontáveis coisas não ditas quase esquecidas apodrecidas em nossas línguas.
A música continua, a vontade de dançar se esvai.
Os olhos meio ocos, voltados para dentro, voltados para trás.
Os sorrisos presos nos cantos das bocas. Um respirar mais pesado pelo nariz é tudo que entregamos.
Evitamos mexer demais para não criar assunto.
A chuva não nós faz mover. Seu cair suave e descompassado em nossos rostos é nossa maior semelhança agora.
Hoje não há vento. O ar estático seria sufocante não fosse gélido.
Talvez a mão apoie a cabeça por que ela pesa.
Um de nós suspirará primeiro. Um de nós levantará primeiro.
A música acaba, precisamos retornar às nossas casas.
Não tarda, a noite finda com o sol a nascer.
Não tarde, feneceremos sem de novo nos amanhecer.