segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020
O frio das entranhas. Queria dizer o frio dentro do frio mas não é isso. Não são como sombras que se aprofundam na escuridão. Emana como um pequeno sol distorcido. O frio da alma. De todos os invernos contados em tristezas, não tive tanto frio. O frio me atinge no meio do verão onde as névoas e chuvas em meio às montanhas fazem esforço para disfarçar a estação que deveria chamar pelo sol forte, cores alaranjadas e cachoeiras. Um frio que parece nascer infinito de um poço e nas alças que se houvessem puxaria e puxaria sem fim. Um frio que todas essas roupas não seguram, que a água do chuveiro a queimar a pele não faz diferença. Tampouco faz a água fria sobre o corpo. É um frio além desse corpo. Além das minhas sensações mundanas e humanas. É um frio que cresceu a ser maior que eu. Um frio que não cessa como as horas cessam, que não passa como as horas passam. Que existe alheio ao tempo numa dimensão própria. E o receio ou realização maior se encontra em que talvez seja apenas um convite sem recusa a pensar-me, que talvez seja apenas a superfície dura e gélida de um espelho.