Prendi os sentimentos numa gaiola menor que a minha.
Por conta disso não consigo sentir-lhes a falta. O vazio é tangível porém. É o espaço de uma mão espalmada e mais um pouco no meio da boca do estômago, é justo donde jorram agora energia e força como um ralo ao inverso. Tudo parece tão possível e tão absurdo, posso correr o mundo e o passo do banheiro à cozinha é um estranho abismo. As paredes não estão girando, as espirais estão paradas. As coisas estão fixas, até estáticas como devem ser, e não se movem. Não sei se encontro tédio ou conforto na falta do derreter do que é tocado pelos olhos.
Penso em deixar o copo de vidro cair ao chão para testar essa realidade, opto por enchê-lo d'água e beber, a hidratação do corpo anda largada, o copo sai da mão em alguma superfície onde está equilibrado e estável. Diferente disso, volto num andar espaçado e manco para soltar o corpo contra uma cadeira, donde fixo o olhar num ponto a não ver nada no mundo e a cada mover de um relógio imaginário, deslizar em descida abissal. Dei a volta errada ao redor dos sentimentos.
Estão novamente a sangrar pela gaiola, algo me diz que não posso contê-los. Talvez a lógica assustasse a mim, mas no momento não é possível dizer. Que coisa horrível olhar para o mundo e pensar. Crio novos sentires antes de reaver os meus. Iremos todos dançar na tormenta. Sou uma máquina de fazer sentimentos. Uma engrenagem de sensações. Mordo meu Caos e beijo minha Loucura. É necessário que seja assim, da loucura não quero arrancar pedaços e do caos não há fragmentos. Sinto que decepciono alguma coisa em mim. Noutro momento, noutra sangria, teremos a racionalidade de volta. Minha calma vem de ser eu uma tempestade maior.