domingo, 12 de dezembro de 2021

Desespero. Fora atingido por isso. Era noite, não importa bem o horário. Se depois do entardecer, antes da meia-noite, exatamente meia-noite, depois da meia-noite, uma ou duas da manhã, algo antes do raiar do sol. Não importa. O desespero era o mesmo, independente do horário. Diferente da forma como o sol toca seu corpo, ou o vento lhe envolve, era algo ao seu redor, como um arrepio que não se cessa, como um calafrio súbito, intenso, e resiliente; indissipável. Ilusões de permanência.

Diferente de uma onda que se quebra contra o mar, contra si mesmo ou contra a areia da praia. O lento arrastar de um começo de tempestade, e a repetição, um lento arrastar em círculos, um lento arrastar em espiral. Não se finda, lentamente se arrastando, percorrendo sua pele, perdido entre seu âmago e seu externo, na película inexistente que delimita suas separações. Algo tão expressivo em algo tão ínfimo. Um quase toque. Uma quase violação. Devaneios dentro de desesperos. Desesperos dentro de desesperos. 

Não é algo que se teme não ser capaz de fugir, é algo dali pra frente, é algo que te espreita, o sono protegerá alguma coisa, talvez alguma distração, o esquecimento se incumbe de isolar o resto. Quando não houver o desespero, ainda haverá a ausência do desespero, ainda haverá um rasgo aberto donde saíra o desespero. Ainda haverá desespero. Como algo feito de ausências de si. Como algo do qual não se pode correr.

No amanhecer, haverá desespero. Em teu solo, em teu sangue, em teu choro - e que fique claro, como sempre, de que não adianta chorar, nem sangrar, nem se jogar contra a parede. Haverá desespero no ar, no cheiro das coisas, no lento desgastar das coisas novas, no lento desgastar das coisas velhas, no lento desgastar de si mesmo, não haverá nada mais absurdo que a vida, ou algo mais atormentador do que a existência. Teus soluços de desespero perdidos em meio a noite, abafados por um silêncio maior, engasgados em todas as frustrações.

As frustrações que são apenas tuas, ou de teus amores, ou de teus amigos, ou de tua família, e se não houver nenhuma assim, a própria frustração de não conhecer essas frustrações, de se sentir raso, de se gastar em atrito contra seu abismo. Não há fuga disso.

Um lento arrastar em começo de tempestade.